Não queremos
aqui dissertar sobre os traços biográficos dessa grande personalidade
caririaçuense e que, para nossa felicidade, ainda habita entre nós. Não vamos
falar quando nasceu, de quem é prole e qual a profissão que exerceu para suprir
as suas necessidades materiais. Falaremos resumidamente de Ana Soares Cardoso,
para os mais velhos e mais entendidos, ela é Donana.
Ela uma é
senhora simples e de hábitos singelos, todavia é possuidora de uma inteligência
esplêndida e uma memória que nenhum superlativo lhe faz justiça.
A título de informação para os mais moços, Donana é simplesmente a letrista do Hino de Caririaçu. Canção que o leitor, se já estiver pelo menos beirando a adolescência, já deve ter cantado muitas vezes e o entoará pelo resto dos seus dias, numa demonstração de amor e empatia pela Serra de São Pedro.
Se os jovens de
hoje bradam a belíssima música Jardim
Molhado do Sertão, do amigo João Kyor, com os belos versos: Sou do Ceará, do interior/Das terras de lá/Caririaçu
é o meu lugar; os nossos avós, pais e até irmãos mais velhos aprenderam a
declamar os versos de Donana: Caririaçu,
terra altaneira/Vimos cultuar a tua bandeira...
A letra do hino
de Caririaçu foi composta em 1967, ano em que nossa cidade era governada por
Raimundo Bezerra Lima (Mundeza) e quando teve início a festa do município no
mês de agosto daquele. Donana, na época, era funcionária da prefeitura e como
Caririaçu não possuía um hino, ela teve a ideia de fazer a letra. A inspiração,
ao contrário do hino de muitos países e cidades, não foi à história do lugar e
seus pequenos e grandes feitos, a inspiração de Donana, como ela mesma nos
afirmou, foi à natureza que circunda e permeia nosso torrão.
A melodia foi
feita pelo maestro João Boaventura e o hino foi cantado pela primeira vez no
dia de São Pedro de 1968, pelo Coral Santa Cecília, coral liderado pela própria
Donana, no Círculo Operário São José (hoje a sede do Grupo de Escoteiros Nossa
Senhora do Carmo).
Além do hino da
nossa cidade, Donana também compôs o Hino da Paróquia de São Pedro que nunca
foi gravado, cujo refrão diz:
Eia povo, povo são-pedrense, avante, avante a bradar
A paróquia centenária, vamos homenagear[1]
Essa pessoa que
anda pelas nossas ruas com passos lentos e vagarosos, às vezes carregando algum
objeto nas mãos e sempre ignorada pela maioria da população caririaçuense,
merece todo o nosso respeito e admiração.
Todavia, Donana
é já uma idosa e, o idoso é desprezado pela lógica irracional humana de só dar
valor aquilo que lhe conferir prestigio, o idoso só tem o conhecimento da vida
passada, sobrevive ao presente e não projeta mais o futuro, apenas o profetiza.
Nos dias em que
vivemos, a sapiência do empirismo e da observação, não têm valor algum. O valor
das coisas contemporâneas está em consumir aquilo que é imposto pela indústria
cultural. Se não consumirmos, nos sentimos à margem dessa sociedade consumista
e individualista, e assim caímos na crença que somos fracassados.
Destarte, por
isso, é fácil desprezarmos pessoas como Donana e, cada vez mais fazermos vênia
ao lixo cultural da televisão.
Que Donana
sobreviva ainda muitos anos. As pessoas que poderem e tiverem oportunidade de
conversar com ela, não perca a chance, garanto que irá aprender mais do que em um ano letivo da escola. Na escola se senta, se cala, faz prova, passa de ano,
para no final ganhar um pedaço de papel. Donana, inconscientemente, pelo menos
foi a impressão que eu tive ao conversar com ela, ensina a conhecer e admirar a
vida, o universo e tudo mais. Sem falar no imensurável conhecimento que ela tem
da nossa cidade.
Donana é parte
importante do patrimônio desse chão e sugere-se que se crie um busto e a faça-se
uma justa homenagem a ela em vida. O busto poderia ser aos moldes do de Padre
Augusto que se encontra na Praça que leva o seu nome. Também poderia fazer
semelhante honraria a outras personalidades de Caririaçu, como, por exemplo, os
escritores Raimundo de Oliveira Borges, Ivan Magalhães (que escolheu a Princesa
da Colina, como ele descreveu Caririaçu, para viver), Célio Mendonça (que só
por ser professor já merece toda nossa reverência), Padre Vicente, a educadora
Maria Floscoeli, o multifário João Kyor (que com sua decisão de se dedicar
somente à música, certamente levará o nome de nossa cidade a lugares longínquos
e inimagináveis), o inesquecível cineasta Zé Sozinho (com o qual me orgulho de
ter conversado em algumas oportunidades, quando labutava numa videolocadora) e
mais alguns outros que buscaram o
progresso e levaram o nome de nossa cidade por onde colocaram os pés.
Esta cortesia
não seria atribuída a nenhum político. Se não apareciam aos borbotões
reclamações dos passados, presentes e vindouros que se sentiriam no direito de
serem agraciados. Sem falar que político é eleito para fazer coisas boas e não há
grandes méritos em realizá-las, quando as faz, é apenas o dever cumprido.
Que Deus dê
ainda muitos dias a Donana, que se aproveite o que ela pode ensinar a essa
juventude bovarista e pavoneada.
Viva Donana. Viva
o nosso o povo, a nossa gente.
Nós não
precisamos importar heróis, em Caririaçu houve e há vida inteligente, gente
boa, gente que honra a gente, gente que se garante.
PS: Este pequeno esboço só foi possível, graças ao incentivo constante do amigo Marcelo Antônio (Marcelo Sam) que desejava fazer essa pequena homenagem a Donana. Ao parceiro Marcelo, que recentemente sofreu uma grande perda e está passando por um momento triste da sua vida, esse texto é dedicado a você.
PS2: As imagens que ilustram esse texto foram
tiradas por Izaquiel Vieira da Silva em janeiro de 2012.
[1] Se
alguém se interessar em conhecer esse hino, entre em contato pelo e-mail: fcopsousa@hotmail.com ou pelo
facebook.com/fcopsousa que eu enviarei o canto entoado pela própria Donana.
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